

O Xamanismo e sua Relação com a história de Shiva
Shiva, na verdade, era uma divindade adorada por pessoas conhecidas coletivamente como Kiratis. A religião original dos Kiratis ainda está viva, embora, infelizmente, esteja diminuindo lentamente. Kiratis são povos indígenas do cinturão montanhoso entre o meio-oeste e a fronteira leste do Nepal. Além da fronteira oriental do Nepal, os Kiratis também são indígenas de regiões hoje conhecidas como Sikkim, Darjeeling e regiões localizadas próximas dali.
As pessoas que se identificam como Kiratis estão geograficamente limitadas ao lado leste do Nepal (do distrito de Sankhuwasabha, até a parte mais oriental do Nepal e até além). Rai, Limbu, Subba, Chamling são alguns

dos sobrenomes comuns do povo de Kirati. Grandes segmentos deles ainda se identificam como Kirati em oposição aos hindus, no que diz respeito à sua fé.
Swasthani é um livro lido pelo menos uma vez por ano pela maioria das famílias hindus no Nepal, principalmente durante um período de um mês, no inverno, como uma tradição. Um membro da família lê o livro e todos os outros integrantes da família ouvem. De fato, não faz muito tempo, muitas pessoas aprenderam a ler justamente por causa dessa prática, tornando muitos nepaleses bem familiarizados com a personalidade e história de vida de Shiva.
Há um capítulo em que Lord Shiva se casa com uma princesa com o melhor caráter possível (decente, responsável) como mulher e também como humana – Sati Devi. Ele chega no alto de Dhaturo (Dhatura) junto com sua comitiva. Os capítulos não evitam elaborar o doloroso desapontamento e desesperança do rei Dakhya (o pai da noiva) por sua filha, pois ela se casaria com o degenerado que também era uma divindade.
Ele aparece em seu próprio casamento alucinado e não é apenas por causa do noivo, mas também por toda a festa em si. O surrado e selvagem Shiva, conforme descrito no livro pelo ponto de vista do rei Dakshya, era um andarilho anti-higiênico e mal comportado que parecia distante das 'etiquetas civilizadas'. Ele foi reverenciado como um Deus em todo o reino e além. Conforme o livro, ele quase não está consciente quando aparece e o rei Dakshya teve que consolar sua filha. Shiva teria utilizado ervas de poder e expandia sua consciência como os xamãs.
Muitos hindus contestam o argumento feito acima no parágrafo anterior. Eles afirmam que Shiva era um deus hindu desde o início e nunca foi um deus xamã, mas apenas compartilhava algumas características comuns com os xamãs. O grande antropólogo que o Nepal já viu, Dor Bahadur Bista, que também é o famoso protegido do famoso antropólogo Christoph Von Furer-Haimendorf, contesta facilmente os argumentos hindus em seu famoso livro Fatalism and Development.
No livro, nos capítulos que discutem Kiratis, ele faz várias referências à famosa saga sagrada do Mahabharata. Em alguns registros da famosa guerra santa na Índia, é mencionado várias vezes que o rei do povo do Himalaia oriental (atual Nepal – a metade oriental) aliou-se aos Kauravas e enviou um exército significativamente grande. No livro, no qual quase todos os personagens seguem alguma forma de religião hindu, os escritores descrevem claramente os Kiratis como estrangeiros pertencentes à fé estrangeira. Seu Deus principal, que hoje é conhecido como Lord Shiva (Paruhang na língua Kirati) é descrito como um Deus estranho de pessoas estranhas, que se intoxicam para falar com Deuses. Há evidências suficientes para apoiar que o hinduísmo primitivo era distinto da religião xamânica de Kirati e eles não faziam parte da mesma fé até muito mais tarde.
Foi somente após a expansão do hinduísmo que a religião indígena Kirati foi trazida para o hinduísmo como muitas outras religiões indígenas, mas menores, embora nem todos os Kiratis adotaram o hinduísmo. Nos tempos antigos, a maioria das religiões era xamânica ou animista ou uma combinação de ambas.
Isso levanta a questão: quando o hinduísmo incorporou tantas religiões menores e como é que Shiva é o único Deus hoje que ainda é xamânico por características? A resposta está no fato de que os Kiratis ainda eram um grupo poderoso e influenciador na época e os hindus tiveram que acomodar práticas mais antigas graças à influência mantida pelos Kiratis. Este é um fenômeno comum na história – “se você não pode vencê-los, acomode-os”.
Há outro exemplo no livro “Fatalism & Development” que demonstra melhor o fenômeno. Quando o povo Khas, do Nepal, se converteu ao hinduísmo em massa, eles não desistiram da tradição do sacrifício de animais.
Ao contrário de outras grandes religiões do mundo, o hinduísmo tem uma história única de como se expandiu. Todas as três religiões abraâmicas se expandiram por pura força. Tanto o cristão quanto o islamismo têm uma longa história de extermínio de outras religiões e de forçar outros a se converterem à sua própria fé. Até mesmo o budismo teve muita violência praticada em seu nome. Em sua essência, o hinduísmo é uma fé que adora a natureza, como a maioria das fés animistas.
No cerne de todas as crenças xamânicas está a noção de que, quando os humanos estão em transe, eles estão em comunicação ativa com deuses, demônios ou espíritos. É por meio de um ritual que eles fazem previsões sobre quando caçar, cultivar, curar doenças ou qualquer outra coisa. Isso levanta a questão: como eles antigamente entravam no estado de transe?
A solução mais comum era e ainda é composta por compostos alucinógenos naturais. A bebida preferida dos antigos xamãs nesta parte do mundo era o Somras, cuja receita já se perdeu na história. A ayahuasca é aquela que ainda está em uso por tribos da selva na floresta amazônica do Brasil para esse propósito.